quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Como um macaco



A noite estava linda, e os olhos daqueles que passavam na frenética Rua XV pareciam brilhar de um jeito incomum. Tomava um Chopp num bar com meu amigo. Ele parecia feliz, até que sua caneta caiu. O amigo desesperou. Embrenhou-se numa busca desenfreada pelas pedras do chão que luziam sob a luz de neon. Apalpava com cuidado as deformidades terrosas daquele chão. Esquecera os óculos em casa, o que tornava ainda mais difícil sua missão. Nada de caneta.
De repente viu-se no meio da rua explorando as solas dos sapatos dos transeuntes. Continuava tateando o chão enquanto passavam apressadamente com suas preocupações e aflições. Deve ter recebido de quatro a sete chutes ao todo, mas ele não se importou. Esqueceu-se da caneta. Aos poucos estava gostando da ideia de andar daquela forma, sem ter que enfrentar os rostos das pessoas. Via os pés das moças, os sapatos dos executivos e os tênis esfarrapados dos mendigos. Apaixonara-se pelos pés.
Percebeu que não precisava mais andar como haviam lhe ensinado. Voltou aos tempos de criança. Redescobriu sua inocência fazendo-se pequeno. 
No dia seguinte acordou e começou a engatinhar novamente. Veio o segundo, o terceiro e o quarto dia e não parou mais de andar daquela forma. Redescobriu sua humanidade andando como um macaco.

(Gustavo Ramos , Bar Mignon. 09/10/13)

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